O município de Tremembé localiza-se na Região Metropolitana do Estado de São Paulo. Fica entre Taubaté e Pindamonhangaba. Segundo dados recentes do IBGE, o município possui pouco mais de 50 mil habitantes e possui uma rota turística bastante visada. Contudo, o que tornou a cidade mundialmente conhecida foi o Sistema Prisional conhecido como uma das que mantém gestão de ponta e tratamento carcerário modelo. A Prisão Tremembé, também conhecida como “Prisão dos Famosos”, passou a se tornar destino almejado pelos prisioneiros do país. Criada e dirigida por Vera Egito, a MGM Amazon Studios produziu uma primeira temporada com 5 episódios contando a história da prisão e dos prisioneiros mais famosos do Brasil.
Tremembé, nesta primeira temporada nos deu um vislumbre de personalidades como: Elize Matsunaga (Carol Garcia); Suzane von Richthofen (Marina Ruy Barbosa); os irmãos Christian e Daniel Cravinhos (Kelner Macêdo e Felipe Simas); Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá (Lucas Oradovschi e Bianca Comparato) e o ginecologista Dr. Roger Abdelmasssih. É fato que o gênero true crime tem ganhado cada vez mais espaço nos streamings e fidelizando um público em alta, sobretudo no Brasil. Entretanto, diferente do que temos visto com a Antologia Monstros, no filme Maníaco do Parque e em séries documentais como O Caso Eloá, Ângela Diniz: Assassina e Condenada; A Vítima Invisível: o caso Eliza Samudio; Volta Priscila; Praia dos Ossos, entre outros... na série do Prime Video, vemos menos sobre os crimes e mais sobre as fantasias comportamentais dos indivíduos encarcerados.
A primeira indagação que levantamos a respeito da série de Vera Egito é a respeito do gênero que se enquadra. Um true crime, como o próprio nome já aponta, aborda e explora a não-ficção de um caso. Ou seja, tenta ser fidedigno aos fatos narrados, seja pela mídia, seja pelo(a) próprio(a) agressor(a). Isso é o que confere o gênero ser digno de seu nome. Entre os críticos do audiovisual, a respeite da série Tremembé, esta pauta é levantada partindo da ideia de que o que assistimos nos cinco episódios que compõem a primeira temporada é que o foco do roteiro não foram os crimes em si. Inclusive eles nem são explorados, surgem apenas para dar embasamento e justificativas do porquê o personagem se encontra preso. Esta decisão esvazia o conceito de true crime ao evidenciar uma narrativa mais fantasiosa e menos real. A produção beira a quase que um deboche, tanto daqueles que sofrem pelo cruel ocorrido, quanto para quem assiste.
Isso não é um erro, contudo, o telespectador precisa desenvolver um novo ponto de vista, pois a produção se assemelha a um estilo sensacionalista de contar as histórias. Ter essa compreensão é necessária, pois faz com que o público perceba que cenas propostas em cada episódio apenas ilustram uma vida possível dentro de um sistema carcerário. Na Netflix, por exemplo, quando Ryan Murphy lançou o primeiro capítulo da Antologia Monstros, contando a história de Jeff Dahmer, a série, apesar de pesada, fria e cruel, tornou-se a mais assistida da plataforma e ainda conquistou Emmys. A própria Prime Video, ao contar a história de Francisco de Assis Pereira, conhecido como “Maníaco do Parque”, também percebeu que o gênero ganha um espaço significativo na audiência.
Diferente destes exemplos, que evidenciam o crime, faz do fato o principal protagonista da história, Tremembé, abre mão desta via narrativa e torna protagonistas, não os crimes, mas os indivíduos. A jovem Richthofen, por exemplo, que ganhou visibilidade por conta da impecável atuação de Marina Ruy Barbosa, parece encontrar um certo tipo de redenção na vida que leva; o mesmo é muito semelhante com Elize, que ganha da atriz Carol Garcia, uma humanidade libertadora. Os pais Nardoni acabam encontrando um caminho em que a salvação, quem sabe pode ser possível, e por aí se segue... O que queremos afirmar é que a série tem seus pontos positivos, e um deles é, sem dúvidas, as atuações. Inclusive, é o que garante o sucesso de views.
Músicas que vão desde Corpo Sensual, com Pablo Vittar; Corpo Fechado, com Gaby Amarantos e Johnny Hooker, até a termos Rita Lee, Ana Canas e Gilberto Gil, a série mostra que tem bom gosto. A cada trilha sonora, vemos a narrativa evoluir com suas histórias, tornando assassinos em pessoas comuns, numa vida comum, mesmo entre grades e muros. A série não tira seu pé do chão, mas decide se afastar de alguns elementos, o que a torna dona de um sucesso positivo. Tremembé, a cidade e a prisão acabam se tornando personagens numa história que guarda outras personagens, personalidades, vidas e comportamentos. É como se o lugar falasse por si e os seus “moradores” fossem apenas coadjuvantes de um sistema... Bom... Talvez seja, não é mesmo?
Uma única cena, de fato, nos prendeu: nas horas finais da temporada, último episódio, a cena em que os prisioneiros conseguem a chance da liberdade por uma semana. Em que cada um pode visitar a família e passar um tempo com os amigos. Ainda têm amigos? Neste momento, a série conquista o nosso interesse e garante a nossa atenção. Que pena, que tivemos que assistir todos os episódios para conseguir, pelo menos, uns minutos finai de “valeu a pena”. Portanto, a série não é sobre os crimes, mas sobre a vida de quem os cometeu e seu dia a dia na prisão. O que acontece ali, permanece ali. E, como afirmou um jornalista que também foi preso em Tremembé: “se tem uma coisa que vende neste mundo, é desgraça”, é triste como esta afirmação parece ser verdadeira dentro do contexto em que vivemos hoje.
Por Dione Afonso | Jornalista