19 Oct
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Você já deve ter ouvido falar nos grandes clássicos do cinema como Psicose, do lendário Alfred Hitchcock, que, em 1960 nos apresentou o monstruoso Norman Bates, ou O Massacre da Serra Elétrica de 1974, dirigido por Tobe Hooper em que Leatherface segue com sua motosserra trucidando corpos à deriva. Ainda temos Jonathan Demme que dirigiu O Silêncio dos Inocentes em 1991. Todas estas e outras histórias possuem um único pano de fundo e origem criativa: a história real de Ed Gein, conhecido como os açougueiro de Plainfield. Gein foi um jovem que, além de se tornar um serial killer, ainda desenvolveu outras psicopatias e sociopatias que aterrorizaram o país. 

A personalidade de Ed Gein foi a narrativa que o terceiro capítulo de Monstros, da Netflix abordou. Sem exageros, podemos considerar esta temporada como a melhor, mais bem escrita e melhor produzida entre as três. No primeiro capítulo acompanhamos Jeff Dahmer; no segundo a história dos Irmãos Menendez e agora Ed Gein com sua “esquizofrenia” e sua falha de memória. Ed Gein é magnificamente interpretado por Charlie Hunnam. O elenco ainda conta com Addison Era; Suzanna Son; Laurie Metcalf; Tom Hollander e Tyler Jacob Moore. Os grandes clássicos do cinema de terror, que se baseiam na história de Ed Gein assumem um recorte da história original e cria sua própria narrativa. Na antologia que Ryan Murphy e Ian Brennan, o serial killer assume os eu protagonismo. 


Abandonando o novelesco para retornar à originalidade do seriado 

O segundo capítulo de Monstros, sofreu pela crítica por conta do tom novelesco que os criadores assumiram para a narrativa. Desta vez, com Ed Gein sob nova perspectiva, temos de volta o teor seriado que o streaming se identifica e coloca em ritmo de série de TV. Foi engenhoso apresentar, durante os episódios o interesse pela indústria cinematográfica em captar tais histórias e transformá-las num certo tipo estranho de entretenimento. Vemos o nascimento do body horror, que, aliás, é bastante criticado na série. Ao encararmos um Hitchcock ambicioso e concentrado no que faz, acompanhamos como que a engrenagem desta indústria funciona e como que, numa roda da fortuna, como que um trabalho pode estar no topo e de um dia para a noite sofrer uma derrocada e ir para o foço do esquecimento. 

A história de Ed Gein teve lugar em Plainfield, Wisconsin. Segundo a ambientação que Murphy e Brennam deram à série, estamos dentro de uma região rural, que fazendas em locais remotos e de cidades pequenas e se muita agitação. Vale ressaltar também a data, estamos no auge da Segunda Guerra Mundial, e acompanhamos os horrores que a comunidade dos judeus sofreu. Gein, ao ter contato com as imagens e as histórias do que os judeus sofreram nas mãos de um regime corrupto e desumano, não conseguiu se recuperar, como se fosse um estopim para se tornar o que se tornou. Outro detalhe deste capítulo de Monstros, é que da mesma maneira que Ed Gein luta para não se tornar um monstro, ou até mesmo ouve de outras pessoas que ele não é um monstro por escolha, e que ele pode ser muito mais humano que outros, a série também nos faz questionar até em que ponto nós nos tornamos monstros de nós mesmos e monstros para os outros. 

Os últimos episódios, ao abordarem O Silêncio dos Inocentes é magistral ao apresentar um assassino em série que se inspira em Ed Gein e constrói a sua própria narrativa monstruosa. A série não economiza nos detalhes e nem se esconde por trás de uma falsa censura para maiores. Desde a ações religiosas rígidas e anticristãs até a distúrbios de sociopatias, necrofilia e outros detalhes mórbidos. As inspirações que os criadores buscam e mesclam neste capítulo funcionam em sintonia com uma história que merece ser esquecida por conta da tamanha maldade humana praticada, na mesma intensidade que lembrar dela serve para nos alertar do quanto que um grande mal pode influenciar pessoas e acabar com vidas inocentes. 


Roteiro e fotografia  

Talvez um dos grandes diferenciais deste terceiro capítulo é a qualidade do roteiro. É uma história muito bem escrita e uma narrativa bem costurada. Diálogos perfeitamente encaixados e história que nos colocam pra pensar a cada dia. Há uma discussão sobre a saúde mental que acontece no Hospital Psiquiátrico que guarda a mente de Ed Gein que serve para os dias atuais. Pensar no cuidado mental das pessoas precisa ser uma ação mais humana e misericordiosa. Mesmo quando estamos falando de alguém que pôs fim a tantas pessoas, Ed Gein tem um passado que nos faz refletir sobre como construímos o nosso futuro e que influências serviram para redefinir quem nós somos hoje. É doloroso ouvir de Gein que ele é uma pessoa que “não possui propósito nenhum”, e quem nem o lugar em que ele está oferece isso a ele. 

Sociopatia, esquizofrenia, psicopatia são doenças e precisam de tratamento, cuidados e acompanhamento. Um outro detalhe das histórias é a cobertura midiática que cada caso recebeu. Vemos isso muito bem explícito no caso dos Irmãos Menendez e, também no de Ed Gein, mesmo que ele seja uma pessoa que viveu durante e pós os horrores da Segunda Grande Guerra. Um detalhe que a história de Dahmer não deu muito destaque. Outras obras continuaram a ser produzidas inspiradas em Ed Gein, algumas com boa abordagem, outras que são bastante questionáveis. Por fim, é válido destacar que narrar a história de outra pessoa, seja ela uma personalidade positiva ou uma como a estes que tentam se assemelhar a monstros da sociedade é sempre um risco a correr. O Silêncio dos Inocentes que o diga... Aguardaremos, com expectativas ao quarto capítulo desta antologia que abordará a serial killer Lizzie Borden.




Por Dione Afonso   |    Jornalista

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