13 Oct
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Nesta última década os filmes sobre os dramas esportivos têm ganhado o interesse do público e a atenção dos especialistas da crítica cinematográfica. Filmes sobre corridas, futebol, tênis, e lutadores apresentam mais que uma biografia de seus esportistas, mas, trazem muita história por trás do que o público costuma assistir quando seus “heróis do esporte” entram em cena. Recentemente pudemos comprovar tal feito quando F1 foi lançado, trazendo um Brad Pitt na pele de um piloto que estava fora das pistas por conta de um acidente que mudou o rumo de sua vida. Quem não se lembra de Will Smith que protagonizou a história de duas filhas que sonharam em se tornarem grandes vencedoras do tênis em Treinando Campeãs

Originalmente chamado de The Smashing Machine, o novo trabalho de Benny Safdie, no Brasil ganhou o nome de Coração de Lutador. Ao lado do irmão, Josh Safdie, juntos dirigiram Jóias Brutas, e, neste ano, separados, cada um apresenta fortes histórias que prometem emplacar boas indicações na próxima temporada de premiações. Josh está com Timotheé Chamalet em Marty Supreme. Benny coloca Johnson, o “The Rock” no papel principal, dando vida ao lutador de MMA Mark Kerr, um ícone das lutas na década de 90 e 2000. Ao lado dele, o elenco conta com a super concentrada Emily Blunt e Ryan Bader no papel do melhor amigo e também lutador Coleman. 


O que mais falta para o “The Rock”? 

A primeira certeza que temos é que Dwayne Johnson não precisa nos provar mais nada em sua carreira e na sua história de sucesso e grandiosidade cinematográfica. O artista já se mostrou ser muito completo, maleável, prático e pronto a encarar qualquer empreitada. Em Coração de Lutador, pela primeira vez assistimos ao tamanho físico de seu corpo por outra e nova perspectiva. Desta vez, não nos interessa tanto o que ele pode fazer com seus músculos. Apesar de ser uma história sobre o MMA, a força maior – ou a falta dela – está no fato de sua mente e sentimentos estarem, também em luta com sua história de vida e com os dilemas relacionais, sobretudo os que ele sofre para construir ao lado da esposa Dawn Staples (Blunt). 

Mark Kerr se mostra alguém que não sabe lidar com a derrota. Primeiro Safdie nos conecta com a derrota no ringue. Mas, o filme é tão bem construído e a narrativa tão bem costurada que o roteiro que o cineasta também assina, consegue nos levar às derrotas que nos derrubam fora do esporte. Aquelas que a vida nos joga no chão, que inesperadamente nos derrubam e nos impossibilitam de nos reerguer. Johnson é um homem enorme – digo, fisicamente – e que, de repente cai. É derrubado pelo oponente numa luta e depois é derrubado pelos vícios e por um ataque cardíaco. O que antes nos parecia impossível, torna-se frágil. Nunca imaginaríamos que um dia veríamos o “The Rock” chorando amargamente em cena. Mas, Benny Safdie conseguiu nos dar isso. Sem glamour, sem fogos brilhantes, sem gritos, mas, com tons secos, roteiro bruto e cenas grotescas e diretas. 

“The Rock”, uma rocha firme e inabalável, apresenta-se frágil e fragmentado. O artista sabe se dar bem desde a comédia até uma ficção-científica. Navega em histórias de monstros até a dramas profundos. Sabe nos fazer rir, sentir medo, vibrar e... desta vez, chorar. Toda a grandiosidade de Coração de Lutador, não ironicamente, habita num coração que é possível sentir dor e amor. Kerr precisou experimentar o amor em sua vida, um amor que pudesse atravessar as correntes dos ringues e atingir a sua casa, sua família, seus amigos e uma história que ele fosse possível construir fora de sua jornada de sucesso profissional. Aqui, a ausência coreográfica nas lutas dá um caráter mais verdadeiro à história e isso valoriza ainda mais a atuação dos protagonistas. 


Emily Blunt e uma coadjuvante necessária 

Outro ganho da obra de Safdie é conseguir dar relevância aos outros personagens que ele constrói para a história. Na maioria das vezes, filmes que colocam seus coadjuvantes como simples gancho ou escadas para que o protagonista brilhe acabam caindo no esquecimento. Desta vez Blunt é relevante, altruísta e sincera com sua personagem. Dar vida a Dawn não pareceu ser uma tarefa fácil. Mesmo enigmática, Safdie tentou tirar a personagem de sua vida fútil e conferiu a ela uma personalidade viva e atual. Dawn é aquele tipo de mulher e esposa que não consegue ficar longe dos dramas de um marido que não a enxerga como deveria, mas, que, mesmo assim, ela acredita no amor verdadeiro e puro dele. 

Infelizmente, parece-nos comum, quem vive e sobrevive do esporte ter que carregar um fardo negativo muito grande na vida: dívidas, vícios, criminalidades, doenças depressivas, problemas relacionais, emotividade aguda e descontrolada... Pelo menos, é o que a maioria das narrativas adaptadas nos mostram. Até mesmo as literaturas revelam isto. A história de Kerr brilha, no ringue e nas telas do cinema. Coleman, seu melhor amigo também vive o drama e que é muito bem interpretado por Bader. Oculto nas sombras da câmera, méritos da edição – feitas em películas 16mm –, também de Safdie, consegue deixar sua relevância na narrativa. Benny Safdie nos presenteia com um estilo independente ao abordar uma história íntima, dolorosa e rica de detalhes, sentimentos e ações.




Por Dione Afonso    |    Jornalista

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