Recentemente nos impressionamos com a boa série contando um pouco da trajetória do brasileiro Ayrton Senna. A minissérie Senna teve como foco a rápida e assustadora jornada do atleta que, com uma ambição grandiosa conquistou não só os pódios, mas o mundo todo por conta de seu carisma e sua boa tática de corrida. Senna se transformava quando estava dentro de um veículo e tudo o que importava para ele era correr, e correr sempre à frente. O esporte que envolve corridas ele é pouco explorado pela indústria da Sétima Arte, o que temos até então são os bons Top Gun que, mesmo sendo uma corrida entre as nuvens, ainda são boas histórias para o nosso entretenimento.
Agora, também pelas mãos do cineasta Joseph Kosinski, responsável por Top Gun 3: Maverick, chega até nós uma história carregada de velocidade que quebra as barreiras da segurança e eleva a aventura em novos níveis. A trinca de atores Brad Pitt, Damson Idris e o espanhol Javier Bardem protagonizam uma história que precisa levar em conta os seus coadjuvantes: enquanto Joshua Pearce [Idris] precisa se consolidar como o melhor piloto do mundo pela APX GP, chefiada por Ruben Cervantes [Bardem], a engenheira automobilística Kate McKenna [Kerry Condor] encontra-se numa tarefa humanitária e de consolidação pessoal em vencer, a qualquer custo e provar o seu valor no cargo que ocupa. Na outra ponta encontra-se o ex-piloto Sonny Hayes [Pitt] que, também está em busca de uma autoaprovação.
Hans Zimmer fez um trabalho impecável com os sons, a trilha sonora e cada toque da música simplesmente encaixava-se naquele pedaço de história. Estamos diante de Hayes, que, depois de anos longe das pistas de corrida recebe uma chance de se provar. Ruben, ambicioso e disposto a qualquer sacrifício para colocar seus pilotos e a APX no topo do pódio, traz de volta um veterano enferrujado, desacreditado, machucado e frágil em trabalhos de equipe e em construir relações seguras. Contudo, Hayes tem de lidar com o jovem Pearce que também é ambicioso, inserido na cultura das curtidas, das redes sociais, do vislumbre e da fama que a internet nos dá.
Dentro de todo este arcabouço encontramos cada personagem em busca de sua glória. Uma vitória que mais do que subir ao pódio e segurar a taça, eles buscam a glória da afirmação, da superação e de poder provar para o mundo que são alguém e que são capazes de algo. A atuação de Idris nos entrega um Pearce imaturo, um jovem aprendiz que está na escola da vida tentando aprender a lidar com as pessoas e com as suas emoções e sentimentos. Por outro lado, temos Pitt, um “velho da casa” que entrega um Hayes autoconfiante, treinado e que voltou à vida após um grave acidente no início de sua juventude. A mistura destes dois resulta numa história poderosa e cheia de emoções.
Pearce e Hayes não são os únicos nesta jornada. A busca da glória é verificada também pelos olhares de Ruben e de Kate. Ambos em busca da clássica pergunta que permeia todo o filme: “por que você está aqui?”. Um ponto fraco no filme, pode-se dizer assim, é a falta de espaço para desenvolver a personagem de Condor. Kate também tem suas ambições, suas inseguranças, seus medos e a trilha de sua vitória. Enquanto ela não se tornar vencedora por algo, ela não se realizaria como uma mulher bem vivida e feliz. Ruben, por outro lado, acaba ganhando mais tempo de tela do que o que ele necessitaria para nos contar quem ele é. Um personagem com poucas camadas poderia ter dado mais espaço para que Condor pudesse brilhar um pouco mais.
É tudo uma história só e é este o melhor ponto positivo desta produção. As tensões que vivemos na pista com os pilotos dentro de seus carros se estendem fora das pistas com as discussões, brigas e os ótimos diálogos. Tecido magistralmente, o roteiro que Kosinski assina junto de Ehren Kruger contém bons elementos. Estamos diante de um drama esportivo de boa qualidade, boas atuações e uma narrativa que endossa os perigos e os dilemas por trás das grandes corridas de Fórmula 1. Vimos isso muito bem antes com Senna, a minissérie e agora vemos confirmado mais uma vez.
Não precisava, mas ganhamos um presente com a aparição no último ato do piloto Lewis Hamilton. O que elevou ainda mais a nossa emoção e o drama automobilístico para as cenas finais. Poder assistir a um piloto já para além da idade que a carreira capitalista e dos clubes de carros se interessa, norte-americano, vencer uma corrida de Fórmula 1 e ainda ultrapassar e vencer Lewis Hamilton em pessoa, é algo indescritível, ou, como se diz, é “Absolute cinema”. Esperamos que a nova temporada de premiações não deixe F1 de fora dos holofotes e deem a ele um prêmio digno o bastante para que nunca esqueçamos que existe uma obra de arte como essa.
Por Dione Afonso | Jornalista