Quando a primeira temporada chegou em 2021, seu criador Hwang Dong-hyuk afirmou que a história demorou 10 anos para ficar pronta. O coreano não desistiu de apresentar uma história que, mesmo baseada em dilemas éticos e morais muito reais entre nós, a primeira temporada fez de antigos jogos de crianças verdadeiros espetáculos da crueldade humana. Entre diversas camadas narrativas vimos: tráfico ilegal de órgãos; falsa caridade com a classe endividada; lavagem de dinheiro; espetáculo capitalista envolvendo bilionários que pagam para assistir aos jogos “mortais”; desaparecimento de pessoas... Nós conhecemos a história de um dos jogadores, o 456, o Seong Gi-hun, interpretado por Lee Jung-jae. Que vence a edição dos jogos na primeira temporada.
Inconformado com tudo o que aconteceu na ilha remota, em que ninguém tem acesso, ninguém sabe, Gi-hun com o seu prêmio de mais de R$ 200 milhões [45,6 bilhões de wons, moeda da Coreia do Sul], ao voltar para sua realidade cotidiana, decide empreender um hercúleo serviço de investigação para descobrir a porta de entrada para os jogos e, voltar para lá a fim de denunciar tudo o que lá acontece. Chegamos na segunda – e incrível – temporada com o famoso Recrutador [Gong Yoo] que nos entregou uma das cenas mais extravagantes e bem-feitas da segunda temporada. Gi-hun retorna à ilha como o jogador 456 e lá ele inicia os jogos com o objetivo de dar fim a tudo e salvar os outros jogadores. O capítulo final desta saga nos entrega um espetáculo cruel, desumano, triste e que nos deixa inconformados com o fato de que a humanidade não se salvará enquanto a alta cúpula econômica continuar usando do poder para se divertir com a morte e a pobreza alheias.
O capítulo final tem sido alvo de hype na Internet. Contudo, a história de Dong-hyuk possui coração e tem plena consciência de onde começou e aonde deveria chegar. É notório quando assistimos a uma história que tenha segurança narrativa e discursiva. Round 6 é assim! Mesmo que o criador não tivesse planejado estender a história, ele a fez muito seguro do que estava escrevendo. Muitas perguntas que surgiram, inclusive na primeira temporada não tivemos sua resposta até então, no entanto, a história deixa claro que não se trata de respondê-las, mas de mostrar que aquela realidade sempre estará presente entre nós. Um ponto alto e que fica em evidência é a presença dos bilionários que bancam os jogos. Pagam para assistir e tem como hobby vê-los, à beira da miséria, lutando com a própria vida afim de conquistar um prêmio que seja capaz de devolver a própria dignidade. Mas, tem que perdê-la, humilhar-se, para conquistá-la.
Além do protagonismo de Gi-hun, ganha destaque o seu amigo/inimigo Front Man [Lee Byung-hun], que inicia o novo capítulo fingindo ser um jogador e depois, revela-se o líder que controla, manipula e mantém vivo os jogos. E seu irmão detetive investigador, Jun-ho [Wi Ha-joon], o policial que, desde a primeira temporada tenta descobrir a localização da ilha e condenar a todos que sustentam essa jogatina mortal. Estes três personagens acabam que dando o tom do capítulo final, mesmo cada um estando fixos numa narrativa, ela acaba entrelaçando as histórias entre um episódio e outro: temos, um jogador, o líder dos jogos e um policial que está do lado externo da ilha. Enquanto o primeiro está na ilha, ele luta para sair dela e salvar quem ele conseguir, o segundo faz de tudo para manter a ilha segura e o terceiro quer destruí-la.
O ponto alto desta história concentra-se em outro trio: a jogadora 222/Jun-hee [Jo Yu-ri]; Cho Hyun-ju/jogadora 120 (Park Sung-hoon) e Jang Geum-ja/jogadora 149 (Kang Ae-shim). Jun-hee dá à luz durante um dos jogos e recebe proteção de Hyun-ju e de Geum-ja, o que acaba custando a vida das duas. Ressalta-se ainda o brilhantismo de atuação de Sung-hoon, uma personagem trans que precisou lidar com seus limites para salvar as amigas a qualquer custo. Já com Geum-ja que ingressou nos jogos, sem saber, com o próprio filho Park Yong-sik/jogador 007 (Yang Dong-geun), no mesmo jogo de esconde-esconde, ela teve que dar fim à vida do próprio filho para que pudesse salvar a 222 e sua filha recém-nascida. A dor de tirar a vida do filho foi tão forte e insuperável, que a jogadora 149 tirou a própria vida durante a noite.
Primeiro: cuidado quando for brincar com uma boneca. Segundo: desconfie quando alguém te convidar para jogar numa estação de metrô e oferecer um convite misterioso. Terceiro: por mais difícil que esteja sua vida, esforce-se para superar com dignidade e vivendo retamente. Além disso, a série encerra sem revelar o desfecho daqueles que detém o poder. Eles parecem sair da ilha impunemente, por trás de suas máscaras cravadas de diamantes e outras pedras preciosas, mantém suas identidades escondidas e, para todos os efeitos, eles nunca pisaram ali. A filha da 222 tornou-se a grande vencedora da edição e Front Man a entregou aos cuidados do irmão, com todo o prêmio. Em Los Angeles, ele se encontra com a filha de Gi-hun e entrega a ela os pertences do pai também com o prêmio que ele havia acumulado na primeira edição.
O sacrifício final de Gi-hun ele tem muito mais camadas do que a que assistimos na tela e a que conseguimos assimilar. Não vencer os jogos era o seu objetivo desde o começo. Salvar a vida de uma bebê não estava em seus planos. Chegar até ali não era o seu objetivo, mas, as artimanhas daqueles que nos manipulam nos fazem tomar decisões que nunca imaginávamos. Round 6 é sobre muitas coisas, muitas histórias, mas todas elas se convergem num único tema: até onde eu sou capaz de ir por um prêmio bilionário? A ganância e a ambição habita em todos os corações, desde os que financeiramente são desprovidos, até os que fazem dos bilhões uma brincadeirinha funesta e vazia de sentido.
Por Dione Afonso | Jornalista