20 Dec
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Quando chegou o primeiro episódio de Pluribus, de uma temporada que seria lançada semanalmente seus 8 primeiros capítulos, nós não teríamos nos convencidos tão rapidamente. Vince Gilligan já havia feito Breaking Bad e foi um grande sucesso, portanto, as chances dele nos decepcionar seriam quase nulas. A série, de certa forma, faz o telespectador sair de sua bolha convencional e explorar novas narrativas, novas possibilidades e novos formatos até mesmo de vida. A série é um sci-fi muito bem construído, com uma sinopse que é curiosa na mesma intensidade que é estranha e complexa: “a pessoa mais triste da Terra deve salvar o mundo dos perigos da felicidade”. E aí? Vale a pena o risco? 

A série acompanha Carol Sturka (Rhea Seehorn), uma escritora de ficção, aparentemente muito bem-sucedida na carreira, mas que se entregou aos perigos de uma vida corrida, sem emoções, sem autocuidado e fissurada no lucro e na boa fama. Resumindo: Carol é o retrato fidedigno de um ser humano da sociedade atual, cansado, depressivo, sem felicidade e amargo. O elenco ainda conta com Carlos-Manuel Vesga, que dá vida a Manousos e temos também Karolina Wydra e Samba Schutte. Carol precisa lidar com uma humanidade afetada por uma espécie de vírus que transformou todos da Terra numa mente coletiva e em pessoas felizes e com senso moral e ético ambiental, humano, social. Carol e outros 11 seres não foram atingidos pelo vírus. Por quê? 


Diálogos intensos e sobrecarregados 

Toda vez que estamos diante de uma produção comandada por Vince Gilligan, a certeza de que ele não irá nos entregar uma história óbvia é certa. Não é diferente com Pluribus. De início nós não conseguimos nos simpatizar com Carol, pois ela era aquele tipo de ser humano dos mais desprezíveis possíveis. A performance ideal de alguém antissocial, individualista, preconceituosa etc. estava nessa mulher. Contudo, as situações a fizeram tomar outro rumo em sua vida. Agora, diante de uma “catástrofe” biológica, ou espacial, Carol precisa lutar contra o que os seus instintos acreditaram a vida toda para salvar o mundo. Destaca-se nessa primeira temporada uma luta interna de Carol, em relação aos seus desejos enquanto mulher e aos seus sentimentos mais pessoais e humanos. 

A fotografia de Pluribus é muito expressiva e real. A cada detalhe, chama-nos a atenção os cuidados que a produção dá a cada capítulo desta temporada. O apagar as luzes de uma cidade inteira, enquanto Carol, do alto de seu condomínio, no alto da serra, que dá a ela uma visão privilegiada. O cenário de sua casa sempre em tons pastéis, destacando-se o solo seco, o calor, a terra amarela, as plantas secas... Quando os lobos silvestres aparecem, eles também se identificam com o cenário fotográfico. Outra cena em que a fotografia diz muito é a do supermercado. As pessoas devolvendo os alimentos à cada prateleira e Carol assistindo a tudo totalmente estarrecida. “Fazer o bem a Carol” é o lema primeiro dessa gente “unida” a uma única mente. 

Gilligan sai da comédia azeda e se envereda numa história de ficção-científica muito bem afiada. Os oito primeiros episódios serviram para nos realocar e nos mostrar do que se trata tudo isso. A relação entre Seehorn e Wydra intensificam o tema e tenta nos oferecer uns sinais do que o futuro nos espera. Wydra, que dá vida à Zosia, é uma espécie de “guardiã” dos desejos de Carol e as duas vão construindo uma conexão que só encontra o seu ponto alto no episódio final da primeira temporada. Aqui, vale falar um pouco de Vesga que passa a primeira temporada inteira lutando contra esta conexão doentia em que todos são um só. Ele empreende uma viagem longa e exaustiva para se encontrar com a personagem de Seehorn. Cenas da próxima temporada... 


Os questionamentos foram postos 

Pluribus nos faz questionar sobre o que chamamos de felicidade. Seja um vírus, ou seja, qualquer outra coisa, o que atinge a humanidade é algo que os conecta numa mente coletiva. O que um sente, todos podem acessar e sentir. O que um sabe, todos podem acessar e ter conhecimento. Ou seja, nada é íntimo ou pessoal, tudo é de todos, pertence a todos, é acessado por todos. Doze pessoas não foram atingidas por este vírus. Carol e Manousos são dois deles. Mas o que a série nos faz pensar é a respeito da vida que levamos atualmente. Ainda não conhecemos Manousos, mas sabemos que Carol já era aquele ser humano que não tinha muita conexão com a ética ambiental, era manipuladora, chata e vivia de forma não muito saudável. 

Na mente coletiva, as pessoas corrigiram muito desses erros. Dormem em grandes salões para economizar energia. Não matam e nem derrubam frutos, pois valorizam todo tipo de ser vivo. Eles se alimentam do fruto que cai do pé, mas nunca colhem algo, contra a vontade da natureza. São sempre gratos, sempre felizes e possuem um sorriso no rosto que é frequente, independente do que lhes aconteça. A virada de chave nesta primeira temporada é quando assistimos Carol, nos três episódios finais, começar a se relacionar com eles, mas com segundas intenções. Reunir o máximo possível de informações a respeito do que são, pois o que ela mais quer é ter sua vida de volta. “Voltar ao normal” do que viviam todos.



Por Dione Afonso   |   Jornalista

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