10 Nov
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O cineasta de origem grega Yorgos Lanthimos passou a ganhar a nossa atenção quando em 2017 nos apresentou O Sacrifício do Cervo Sagrado. A obra reuniu Colin Farrell, Barry Keoghan e Nicole Kidman e Lanthimos narrou uma história bastante assustadora. Suas obras são marcadas pela crítica social e por elementos relacionais que põe o dedo em nossas feridas, contudo, o diretor não é muito claro, o que nos faz mergulhar mais a fundo em seus filmes. Das obras mais recentes, destacamos Pobres Criatura de 2023 e Tipos de Gentileza de 2024. Neste ano ele nos apresenta Bugonia, fazendo da atriz Emma Stone meio que protagonizar uma trilogia. A atriz esteve presente nas 3 mais recentes obras de Lanthimos e ela se entrega à bizarrice e atua com originalidade em cada papel que o roteiro a apresenta. 

Em Bugonia o elenco, além de trazer Emma Stone no papel principal, também traz – mais uma vez – Jesse Plemons, outro ator que vem se mostrado muito perspicaz em suas atuações. Junto da dupla, temos Aidan Delbis, Stavros Halkias e Alicia Silverstone, que também esteve na obra de 2017. Lanthimos ataca desta vez a comunidade dos conspiradores e daqueles que preferem acreditar em fake news do que se ancorar nos fatos que a vida lhes apresenta. O personagem de Plemons é aquele típico sujeito louco que, talvez por não conseguir superar o drama da perda, escolheu o caminho da conspiração científica e se enclausurou em seu universo de obsessões e segredos. 


Sim! Há alienígenas entre nós 

Plemons e Delbis interpretam Teddy e Don, dois adultos que se convenceram de que a Terra está infestada de seres alienígenas que se infiltraram entre os humanos com a missão de aniquilar toda a espécie humana. É interessante e até mesmo muito real a maneira em que o roteiro que é assinado por Will Tracy nos mostra como que eles chegaram a esta conclusão. Vemos a bagunçada casa dos primos e o quanto eles se apropriam de materiais duvidosos como vídeos do youtube, reportagens de revistas, livros de ficção e até uns podcasts que defendem a ideia conspiratória da invasão alienígena à Terra. O filme tem um jeitinho estranho de “Não Olhe Para Cima”, da Netflix, com Leonardo DiCaprio e Jennifer Lawrence, que interpretam dois cientistas que tentam avisar ao governo americano que um meteoro está na órbita da Terra. Mas, é preferível ignorar, “não olhar para cima”, e seguir a vida. 

A ciência, portanto, parece perder sua credibilidade e não consegue mais convencer seu público de fatos que podem alterar o curso da história. Lanthimos se inspira nesta ideia, contudo, ele aplica o seu jeito bizarro de encarar os temas reais e lança diante de nós uma narrativa que nos assusta ao mesmo tempo que nos amedronta. Bugonia é uma releitura de uma obra sul-coreana de 2003, Salve o Planeta Verde!, que foi dirigido por Jang Joon-hwan. E o termo que Lanthimos escolhe para o remake é um termo grego que remete a um conceito mitológico a respeito das abelhas. “Bugonia” acreditava-se que as abelhas nasciam de um boi sacrificado, - “boûs” significa “boi” e “gone” é “nascimento”. O termo, no novo filme ganha esta simbologia mitológica que se apropria da conspiração de seus personagens para sustentar a ideia subvertida da invasão alienígena. 

Ao explorar os temas do renascimento e da conspiração, “bugonia” é o termo perfeito para nos apresentar uma narrativa que parte do absurdo e se estende a uma realidade entre nós. Teddy é o que mais se afunda nesta proposta, mas quem sofre, de fato é o primo Don, que, ao ser questionado pela personagem de Stone, ele não consegue se desconectar da conspiração e acaba tirando a própria vida. O perigo das fake news que diariamente recebemos em nossos celulares é muito grave. Uma grande parcela da sociedade se ancora em falsidades e conspirações que os levam a construir uma vida pautada em mentiras e absurdos o que pode levar a um extermínio humano, a guerras incontroláveis e a tragédias de proporções inimagináveis. 


Não é novidade, mas Emma Stone brilha, mais uma vez... 

Michelle Fuller é uma CEO de sucesso que comanda uma empresa de cosméticos e que se tornou uma figura altamente respeitada na sociedade. Fuller, personagem de Stone, é raptada por Teddy e Don por acreditarem que ela é uma das alienígenas que está disfarçada de ser humano na Terra. Teddy, inclusive a culpa pela quase morte de sua mãe, que se encontra em coma no hospital. Teddy é tão devoto de sua teoria, que quando Fuller propõe uma saída para salvar a sua mãe, ele consegue acreditar em qualquer absurdo que contam para ele. A cena do armário dentro do escritório é assustadora na mesma medida que é hilária e sem condições de alguma crença. Mas Teddy acredita piamente que dali ele iria entrar em contato com a nave extraterrestre. 

Além da teoria conspiratória, Lanthimos ainda explora o tema da paranoia digital, e coloca o acesso à Internet como porta principal para se consumir fake news e conteúdos relacionados. Como crítica relevante e atual, ele tenta mantê-las sempre ativas na nossa memória a cada frame que nos apresenta. Todo o filme está nas costas da atuação de Stone. Por mais que Plemons esteja bem em sua atuação, seu personagem sofre com as falhas do roteiro. Mas, para encerrar a história, o cineasta decidiu brincar com o bom senso e nos deixar irritados na cena final: Fuller é ou é uma alienígena? Bugonia é uma teoria da conspiração? Lanthimos é um alienígena? Será que nós fomos ludibriados com uma teoria que nos fez acreditar no inacreditável? O longa, é uma obra relevante e atual, mesmo quando zomba da nossa capacidade de inteligência.



Por Dione Afonso  |  Jornalista

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